Por Lereno Soares

Toda a mágica em torno dos modelos de risco de crédito dos bancos tem uma finalidade pura e simples: quem empresta quer saber se será pago de volta ou não.

Se houver muitos sinais de que você vai me dar um calote (ou default, como dizemos no economês), eu não te empresto.

E caso eu decida emprestar, só farei isso a uma taxa alta, de modo que mesmo depois de todos os calotes que eu tomar (de você e de outros inadimplentes), eu ainda consiga ter lucro com aqueles que me pagaram em dia. Dessa forma, os bons pagadores sustentam – por meio das altas taxas de juros – a massa inadimplente.

Como muitas coisas na economia, o objetivo é claro, mas a tarefa é coisa de cartomante: como fazer um julgamento sobre o comportamento futuro de alguém?

Como é hoje?

Hoje os bancos tentam prever a sua capacidade de pagamento basicamente a partir do seu:

  1. histórico de pagamento
  2. comprometimento de renda

Cabe aos bureaus de crédito (os cadastros de negativados como SPC, Serasa e SCPC Boa VIsta) registrar os maus pagadores. A ideia é simples: as empresas colocam todo mundo que deu calote numa lista. Sempre que você for emprestar para alguém, você olha se a pessoa está nessa lista.

Assim, a decisão é construída a partir da história, do passado, da fama do tomador de empréstimo. Se o cliente tiver fama de mau pagador, lhe será negado acesso a crédito. Em outras palavras, é necessário que o emprestador perca dinheiro nessa história.

Num contexto de crise pós expansão abrupta da oferta de crédito, é de se esperar que milhões de brasileiros tenham sofrido choques negativos de renda e estejam entrando nessas listas, tenham eles comportamentos de risco ou não.

Já o critério de comprometimento de renda é uma medida que tenta enxergar o futuro. Há uma regra de bolso que diz que você não pode comprometer mais do que 30% da sua receita mensal com o pagamento de dívidas.

Dessa forma, se você prometer que vai me pagar em suaves parcelas de R$400, mas eu souber que você ganha R$1.000, eu verei que essa proposta é surreal, e dificilmente você – apesar das suas boas intenções – vai conseguir me pagar de volta.

Para onde o futuro aponta?

Já dei a deixa para onde a evolução quer ir: a ideia é antever a perda de dinheiro decorrente de um calote antes mesmo que ela aconteça.

A história de alguém é um bom sinal para o comportamento de amanhã, mas como se diz no mundo dos investimentos, a rentabilidade passada não é garantia de rentabilidade futura.

O que os bancos – e especialmente as fintechs de crédito, como Nubank, Geru, Lendico – querem olhar é como as pessoas agirão, como elas se comportarão no futuro. E para isso a psicologia entra em cena muito mais do que a análise de um fluxo de caixa.

Imagine você saber que uma pessoa tem um fraquíssimo autocontrole para compras: um cartão de crédito na mão dela é uma bomba-relógio.

Você preferiria emprestar dinheiro para alguém que têm hábitos de vida saudáveis ou alguém que gasta demais com álcool em dias de semana?

Como captar esses hábitos e traços de personalidade?

Parece até episódio Black Mirror, mas algumas companhias já estão se especializando em perceber os traços comportamentais dos clientes a fim de revolucionar os modelos de risco de crédito: a partir do que você posta nas redes sociais, da força dos seus relacionamentos na sua rede de contatos, do seu histórico de navegação, geolocalização, ou mesmo por testes psicológicos é possível ter boas predições sobre seu risco de não pagar um empréstimo.

Score de Crédito para Desbancarizados

Saber que suas pegadas na internet podem te ajudar ou dificultar um empréstimo pode parecer assustador, mas para a parcela desbancarizada da população mundial isso será a porta de entrada para o mercado de crédito e acesso aos mercados globais.

Sem acesso ao crédito nos bancos tradicionais por não terem uma identidade financeira, essa população fica com poucas opções nas mãos para impulsionar seus negócios e suas vidas, tendo que recorrer a agiotas ou, na melhor das hipóteses, ao microcrédito, que ainda está longe de suprir a demanda desse público.

A filipina Lenddo começou operando justamente no microcrédito, mas após 4 anos no mercado resolveu se especializar na venda de seu modelo de risco de crédito utilizando big data, machine learning e a análise de redes sociais.

A Tala (antiga InVenture) permite de forma semelhante que qualquer um com um celular (não precisa ser um smartphone) possa ter um registro financeiro. A fundadora Shivani Siroya explica excepcionalmente o conceito dessa tecnologia nesse TED de fevereiro de 2016 (clique aqui para ver).

A holandesa Nicole Van Der Tuin fundou a FirstAccess com a missão de transformar dados em oportunidades financeiras. Ela oferece a plataforma de score de crédito para instituições de crédito em países emergentes, tendo passagem pela África, Asia e América Latina.

Já a Kreditech, além da análise de Big Data, é também dona da Kontomatik, empresa que promete dar acesso às fintechs de crédito aos registros bancários de seus clientes por meio do desenvolvimento de APIs.

Usando blockchain, a Banqu visa dar uma identidade financeira àqueles que, apesar de ter capacidade de produzir e sair da pobreza, não conseguem acessar os mercados globais.

Personalidade para turbinar investimentos e educação financeira

Recentemente a Comissão de Valores Mobiliários lançou duas publicações sobre os viéses do investidor e do poupador, que podem ser acessados clicando aqui. Esses vícios comportamentais afastam o investidor de tomar decisões racionais, tendo impacto profundo sobre seu futuro, seja ele do nível de renda que for.

A atenção à psicologia econômica é um fenômeno global. O Barclays, um dos maiores bancos do mundo, oferece um teste de personalidade financeira em sua área de Investimentos. Da mesma forma a Aviva, maior seguradora do Reino Unido, identificou 10 tipos de personalidade financeira do país, resultando num questionário de 35 perguntas a fim de identificar em qual deles o poupador se encaixa (dando dicas em como lidar melhor com a sua personalidade de investidor).

Aviva Save Smarter

Mas nem tudo é liberado

No fim do ano passado a Admiral desenvolveu uma ferramenta para cotar seguro de carro para quem nunca teve um antes. Por meio de análise do perfil do facebook, a companhia de seguros britânica desenvolveu o “First Car Quote”, oferecendo descontos para aqueles que pareciam ser motoristas mais cuidadosos.

Pouco tempo depois, como noticiou o Telegraph, o facebook bloqueou a Admiral. Segundo a política de desenvolvimento do Facebook, não é possível usar “dados obtidos por meio do Facebook para tomar decisões sobre qualificação, incluindo se deve aprovar ou rejeitar um aplicativo ou quanto de juros deve ser cobrado em um empréstimo”.

Oportunidade para as Fintechs

Entender os traços psicológicos dos clientes pode não só dar pistas sobre o risco de crédito como também personalizar a experiência do usuário e adequar conteúdos de educação financeira.

Entender o cliente sempre foi e sempre será chave para o sucesso de qualquer empresa.

Sobre o autor:

Lereno Soares - risco de crédito - juros baixos - redes sociais

Lereno Soares

Economista pela FGV-RJ e assessor de investimentos certificado pela Anbima, Lereno Soares é cofundador da Juros Baixos, empresa que tem a missão de dar transparência e estimular a concorrência no mercado de crédito. No site você pode simular e comparar empréstimos em diversos bancos, financeiras e fintechs de crédito online.

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